Qual poderia ser a relação destes dois belos trechos de Húmus de Herberto Helder com xamanismo? (a marcação de páginas é desta recente edição da Tinta-da-China) Qual passagem de Metafísicas canibais de Eduardo Viveiros de Castro pretendo citar para mostrar essa relação? Venham ao meu curso, que se inicia na próxima quarta feira, e saberão.
HERBERTO HELDER
Fecho os olhos: vejo virem os gestos. O espanto
recamado de mundos caminha
desabaladamente.
Sinto os mortos.
A terra remexe. De mais longe
vem um ímpeto. Põe-se a caminhar a imensa
floresta apodrecida. Ouve-se
a dor das árvores. Sente-se a dor
dos seres.
vegetativos,
ao terem que apressar a sua
vida lenta. Pôs-se a caminho
um remexer de trevas. E não tardaram
as dispersas primaveras
uma atrás da outra. (p. 217)
[…]
Vê tu a árvore: uma camada de flor – um grito,
outra camada de flor – outro grito.
Sob o fluido eléctrico, o quintal
tresnoita. Até o escuro se eriça. Há diálogos
formidáveis na obscuridade.
Nesta primavera há duas primaveras – perfume,
ferocidade. Turbilhão azul sem nome.
O sonho irrompe como hastes de cactos, pélago
desordenado.
– Eu sou a árvore e o céu,
faço parte do espanto, vivo e morro. (p. 221)
Também separei trechos de Os selos de Helder – e mais de Gérard de Nerval, Rimbaud, Jorge de Lima e outros. O curso já foi divulgado aqui: https://claudiowiller.wordpress.com/2017/02/22/poesia-e-xamanismo-um-novo-curso/
Posted by Carlos Figueiredo on 03/03/2017 at 20:35
extraordinário. Não tinha idéia. Queria ter escrito. É o que vejo. Esse é a novo.
Posted by Carlos Figueiredo on 03/03/2017 at 20:36
Tem a ver, muito a ver, com Saint John Perse.
Posted by contosdoevandro on 04/03/2017 at 11:08
Belos trechos de poema. Mesmo para mim evoca um xamanismo, imagino que para você seja uma grande viagem.