Posts Tagged ‘Baudelaire’

APROXIMAÇÕES ÀS VANGUARDAS: um novo curso ou ciclo de palestras

Étienne_Carjat,_Portrait_of_Charles_Baudelaire,_circa_1862

Programamos algo diferente, entre o curso típico e o ciclo de palestras. Ocasião para conversar com o público, mostrar poesia – e também artes visuais – e destacar alguns tópicos originais, polêmicos ou instigantes.

Informa a Casa Mario de Andrade:

CURSO: APROXIMAÇÕES ÀS VANGUARDAS

Por Claudio Willer

Quando: Sábados, 5 e 19 de maio e 2 e 16 de junho, das 15h às 17h

Onde: Casa Mário de Andrade, Rua Lopes Chaves, 546 – Barra Funda

Telefone: (11) 3666-5803 / 3826-4085

Inscrição Online

O que vai ser:

Uma série de palestras ministradas pelo poeta, tradutor e crítico literário Claudio Willer, pretende revelar ao público o sentido das vanguardas artísticas do século XX. Seguem-se os temas de cada encontro:

5 de maio: Dos simbolistas e decadentistas às vanguardas: quando a poesia enlouqueceu. A contribuição decisiva de Baudelaire. Lautréamont, Rimbaud; o enorme Alfred Jarry.

19 de maio: Todos os tempos e todos os lugares na poesia: dois poemas matriciais, “Zone” de Guillaume Apollinaire e The Waste Land, de T. S. Eliot.

2 de junho: Surrealismo: desfazendo alguns equívocos. O Brasil é um “país surrealista”? (Não, não é….). A complexa relação de poesia e vida.

16 de junho: Vanguardas e a recuperação do arcaico. Poetas-xamãs. Há ou houve uma segunda vanguarda? (Beats, surrealistas portugueses etc.).

Venham. Informem a interessados.

 

POESIA E CIDADE NO SESC BELENZINHO

Étienne_Carjat,_Portrait_of_Charles_Baudelaire,_circa_1862

quando: Dia 20 de março, terça feira, das 19 às 21 h. SESC Belemzinho,

onde: R. Padre Adelino, 1000 – Belenzinho, São Paulo – SP, 03303-000, Fone (11) 2076-9700

Convidado por Caco Pontes, eu me apresentarei no ciclo Musa Cidade, com  uma panorâmica das relações entre poetas e metrópoles modernas, desde William Blake (sim, nisso ele também foi precursor) e o indispensável Baudelaire até contemporâneos como Roberto Piva.

Informa o SESC Belenzinho:

LITERATURA

Práxys Poétika: Musa Cidade COM CACO PONTES E CONVIDADOS

A oficina tem como principal abordagem a performance poética contemporânea, nos aspectos sonoros, vocais e corporais, contando também com exercícios de criação literária para levantamento de material. Diversas referências são pesquisadas através de textos, vídeos e áudios no decorrer dos encontros, com o objetivo de provocar a percepção estética, senso crítico, além de estimular o desenvolvimento rítmico e fonético. A temática central desta edição será pautada na relação poética com a cidade de São Paulo, passando por conteúdos clássicos, contemporâneos, além de receber convidados e convidadas especiais, oferecendo experimentos nas diferentes áreas e linguagens que serão investigadas ao longo da oficina.

Participações:

20/3 – Claudio Willer
27/3 – Sandra-X
03/4 – Claudia Schapira
10/4 – Caleb Mascarenhas
CACO PONTES é poeta e multiartista. Autor dos livros ‘O incrível acordo entre o silêncio & o alter ego’ (2008), ‘Sensacionalíssimo’ (2013), ‘Sociedade Vertical’ (2014) e co-autor de “Varal de Poemas” (2010), antologia publicada em Barcelona, com traduções de seus poemas para espanhol e catalão. Participou como convidado de mostras e festivais como Flip, Balada Literária, Bienal do Livro de SP, Feira do Livro de Buenos Aires, Feira do Livro de Guadalajara e Primavera do Livro do Chile. Sócio-fundador da plataforma de produção criativa Panaméricas Diásporas, idealizador dos projetos Baião de Spokens, Verso Móvel Sound System, Cordelíricos e integrante do grupo Stereotupi. Tem composições em parceria com Alice Ruiz, Gustavo Galo e Jonathan Silva.
Local: Sala de Oficinas 3

Vídeo da palestra sobre Drogas e Literatura

Chegou, enviado por Julio Delmanto do coletivo DAR. Foi a 20 de agosto, no auditório da Faculdade de enfermagem. Achei que ficou bom, audível, gravação de qualidade. São dois segmentos, totalizando mais de uma hora e meia. Abertura do segundo segmento está divertida, eu dizendo com ênfase: O HOTEL PIMODAN…! E fazendo algumas ironias. Identifico-me com aquela turma – e outras. O final, vejam / ouçam, as boas observações de Octavio Paz: drogas contrapostas à moral do trabalho.

http://coletivodar.org/2013/11/drogas-e-literatura-videos-de-palestra-da-claudio-willer/

Próximo passo – transformar em artigo. Ou ampliar e dar curso. Ou ambos, entre outras coisas.

O anúncio da palestra, relatando sua gênese:

https://claudiowiller.wordpress.com/2013/08/12/darei-palestra-sobre-drogas-e-literatura/

A sinopse, com os tópicos que examinei:

https://claudiowiller.wordpress.com/2013/08/20/palestra-drogas-e-literatura-minha-sinopse/

Mais sobre moda e cultura

Em tempo, postado no dia seguinte: Vejam os comentários. Há polêmica e observações interessantes.

Saiu artigo de Marta Suplicy defendendo o incentivo fiscal para a moda, na Folha de hoje:

http://www1.folha.uol.com.br/fsp/opiniao/126354-moda-e-cultura.shtml

Ia apenas registrar no Facebook, com uma breve nota. Mas o assunto tem nuances que demandam um comentário mais detalhado.

A questão não é incluir ou deixar de incluir moda – ou, como diz a ministra, “nossas milhares de confecções charmosas” – como modalidade artística. Discussão nesses termos é briga de corporações. O problema é outro: está tudo errado no campo dos incentivos fiscais para a cultura via Pronac ou Lei Rouanet. Autorização de patrocínio para empresários da moda é mais uma distorção que vem somar-se aos incentivos para show da Xuxa e inumeráveis outros que não precisavam disso, com patrocínios certos e renda garantida. Algo que seria corrigido através de um Plano Nacional da Cultura que parece ter sido obliterado de vez.

Moda pode ou não ser cultura. Depende da definição de cultura adotada. Tomando a definição mais ampla, como o conjunto da produção simbólica, tudo passa a ser cultura – e o Ministério da Cultura, um hiperbólico ministério de todas as coisas. Ou então, todo o governo seria cultural –  aliás, deveria ser. Museus da moda? Ótimo. Palestras, cursos de estética, sociologia e semiologia da moda? Que venham. Mas isso é uma coisa e patrocínio dos desfiles é outra. A ministra observa: “A cadeia produtiva da moda é gigantesca: dos botões aos zíperes. Das costureiras às fábricas têxteis. Das pequenas confecções aos ateliês dos famosos. Das vendedoras aos estilistas. São milhares de pessoas dinamizando a economia e criando empregos.” Sim – mas tudo tem cadeia produtiva, e faz muito tempo. A cadeia produtiva da moda inclui os bolivianos em regime de trabalho escravo costurando peças que depois seriam adquiridas por essas grifes – e todos continuariam fingindo não saber disso, se um grupo desses sub-proletários não tivesse sido assassinado por assaltantes, recentemente.

Baudelaire escreveu o elogio da moda e da maquiagem: para ele, manifestações do sumo bem por serem artificiais, em contraste com o natural, sempre mau. Mas sua argumentação continha uma crítica. Valorizou a diversidade, a expressão individual, em contraste com a uniforme sociedade burguesa. Chegou a pintar o cabelo de verde e a usar uma extravagante e enorme echarpe cor de rosa. Produzia-se. Foi um provocador. Ser um “dandy” era desafiar convenções, expressar rebelião.

Crítica. Rebelião. Desafio às convenções. Provocação. Categorias que gostaríamos de ver incorporadas aos apoios a manifestações culturais. Mas está cada vez mais difícil de acontecer.

Poetas malditos e Piva: ensaio em Eutomia, e mais

Saiu meu ensaio, “Poetas malditos: de Baudelaire e Nerval a Piva” em Eutomia, o periódico on line editado por Sueli Cavendish, da Universidade Federal de Pernambuco. Está em:

http://www.repositorios.ufpe.br/revistas/index.php/EUTOMIA/article/view/244

Reparem que, no pé da página, tem botão para abrir o pdf. E no pdf tem botão para ‘tela cheia’. Portanto, cliquem no link, nos botões, e leiam o ensaio.

Em um evento universitário recente tratando desse tema, de considerável diversidade, um participante declarou que não há mais poetas malditos. Minha intenção, ao escrever o artigo, foi tentar especificar com maior clareza – através de algum deslocamento da sociologia para a literatura comparada – o que vêm a ser poetas malditos. Sustento que o uso dessa categoria é consistente ou apropriado, quando aplicado à linhagem que vem de Baudelaire e Nerval até Piva, passando (evidentemente) por Rimbaud. O ensaio também costura algumas pontas soltas em meu Um obscuro encanto, e prossegue observações em meu artigo sobre Rimbaud na revista Cult.

Evidentemente, o tema sobra. Em cursos sobre poetas malditos – o mais recente, na Casa das Rosas em 2010 – também examinei outros autores. Mas me parece que, desta vez, além de circunscrever a categoria, justificar seu uso e mostrar a raiz remota – xamanismo, mito de Orfeu – e ao mesmo tempo a contemporaneidade, contribuí para esclarecer a relação de Piva com Dante. E suas posições políticas mais recentes, o monarquismo (por décadas, declarou-se marxista), estranho à primeira vista, porém simbolicamente substancioso.

Haverá mais. Após escrever o artigo e dar palestra – esta: https://claudiowiller.wordpress.com/2013/06/24/palestra-em-diadema-poetas-malditos-e-piva/ – enxerguei motivos adicionais para o Inferno ser o best-seller da trilogia de Dante (notem bem, de Dante, e não desse deplorável contemporâneo) e despertar tamanha fascinação em românticos e neo-românticos rebeldes.

Já havia, a convite de Sueli, publicado poemas em Eutomia:

http://www.revistaeutomia.com.br/volumes/Ano4-Volume1/poesias/POEMASCLAUDIOWILLER.pdf

Este fim de semana saiu também artigo meu sobre Buñuel e religião, em Tertúlia, de Renato Alessandro dos Santos:

http://www.tertuliaonline.com.br/postagem/ver/326

Repito meu bordão preferido: haverá mais …! Publicarei uma pequena série sobre surrealismo e cinema.

Darei palestra sobre Drogas e Literatura

Data: dia 20 de agosto, terça-feira. Horário: Às 19 h.

Local: auditório da Escola de Enfermagem, USP.

Endereço: Av. Dr. Enéas Carvalho de Aguiar , n. 419, Metrô Clínicas – sim, é aquela rua dos prédios do Hospital das Clínicas, paralela à Dr. Arnaldo

Organização: Coletivo DAR (Desentorpeça a Razão) e GEDS (Grupo de Estudos Drogas e Sociedade)

Em: http://coletivodar.org/2013/08/terca-208-palestra-drogas-e-literatura-com-claudio-willer/

Ou: https://www.facebook.com/events/199026053592931/?context=create

Cartaz ficou uma beleza, sugestivo. Não cola neste blog, seguirá por e-mail.

A gênese dessa palestra é interessante. Em 2011, pouco depois de abrir este blog, havia-me manifestado sobre a proibição da “marcha da maconha”. Declarei-me à disposição para dar palestra sobre esse tema. Aqui:

https://claudiowiller.wordpress.com/2011/05/21/blog-como-tribuna-livre/

Organizadores viram. E me convidaram.

Claro que meu tratamentos será especificamente literário. Poético, melhor dizendo. Do romantismo até contemporâneos. Algo já foi ouvido em meu último curso de Geração Beat, ano passado: o paralelo entre os Paraísos Artificiais de Baudelaire e a gênese de sua crítica de arte, e os relatos de Ginsberg sobre ver quadros de Cézanne e desenvolver uma poética. Acrescentarei – desde os Poetas do Lago até Henri Michaux. Palestra será longa – uma hora e quarenta e três minutos (aproximadamente). Temas uruguaios, tratarei tangencialmente – mesmo porque Ginsberg já havia aberto nessa direção, em 1971. Depoimento, se insistirem, no debate.

Problema não será a falta de assunto.

Venham.

Na véspera, estarei tratando de García Lorca (que mês prolífico – Baudelaire, Kerouac, Lorca, drogas, Buñuel…). Também noticiarei. Tudo.

Baudelaire e o corpo: um ensaio

Saiu em um periódico acadêmico on line, FronteiraZ, da PUC (haviam-me convidado – não “submeto”, assim como também não me inscrevo em simpósios e tal, vou se me pedirem que vá):

http://revistas.pucsp.br/index.php/fronteiraz/article/view/14715

A capa / entrada do periódico, com outras matérias de evidente interesse, é esta:

http://revistas.pucsp.br/fronteiraz

Postei ontem (domingo, 04/08) no Facebook. Até agora, deu 21 compartilhamentos e 63 ‘curtir’, além de comentários de leitores. Bastante. Gostei. Resolvi noticiar aqui, pois este blog tem circulação autônoma.

Claro que dá margem a observações um ensaião acadêmico, nos conformes, seguindo normas da ABNT (ou é ABTN?), extenso, com 19 laudas, ter essa circulação. Justifica otimismo. É mais um desmentido ao mito de que redes sociais são apenas para trivialidades. Tem de tudo – um pólo da imbecilidade, representado principalmente pelos censores, e outro da cultura.

Também mostra que publicação no meio digital é a solução para os periódicos de universidades – alternativa é levar anos para sair, repousar em bibliotecas, servir apenas para engordar o Lattes e somar em alguma pontuação.

Este meu ensaio é desdobramento do que havia sugerido em “Um obscuro encanto”. Exponho, mais uma vez, que somos todos baudelairianos, mesmo escrevendo de modo inteiramente diverso. Quadros de referência podem ser projetados em outros poetas – tenho anotações, daria livro (alô alô editores).

Um bom começo de agosto. Notícia de que um livro meu está efetivamente na gráfica – portanto, será impresso. Bonita repercussão dos haicais de Kerouac – farei apresentação pública. Dia 20 darei palestra escandalosa – aguardem. Logo sairá outro ensaio meu em periódico eletrônico, sobre poetas malditos. Há mais publicações e apresentações no horizonte.

Noticiarei tudo.

A comicidade

Faleceu recentemente, a 6 de junho, a atriz-nadadora Esther Williams. Comentei, em 2009, uma cena de seu filme de estréia, protagonizada pelo comediante Red Skelton: talvez a mais engraçada que já vi no cinema, pelo extremo ridículo.

A cena não está disponível no Youtube. Pena. Tem o filme todo. E o trailer, com um rápido fragmento do balé com Skelton:

http://www.youtube.com/watch?v=zbn5XQpmNgo

Meu artigo, na revista Reserva Cultural (pretendo reapresentar outros, aqui – já havia republicado um sobre Hitchcock, em breve sobre Buñuel e David Linch):

O RISO DESENFREADO

Quanto já se refletiu sobre o riso, o cômico, a gargalhada! Para Baudelaire, o “monstruoso fenômeno”, “um dos mais claros signos satânicos do homem”, negação da Queda. Para Octavio Paz: “A gargalhada é uma síntese (provisória) entre a alma e o corpo, o eu e o outro. […] Volta à unidade do princípio, antes do tu e eu, em um nós que abarca todos os seres, bestas e elementos”.

Publicaria séries sobre experiências de superação da dualidade, fusão no todo através de acessos de riso em salas de cinema. Incluiria um obscuro e distante média metragem de Laurel e Hardy, o Gordo e o Magro, no qual invadem uma serraria, jogam um daqueles carrões quadrados sobre uma serra de fita, caindo – os dois cômicos e as duas metades do carro – um para cada lado. As convulsões que devo a Harpo Marx, a Harold Lloyd dependurado em um prédio, a… Na cinematografia mais moderna, a What’s up, Dock? (Essa pequena é uma parada) de 1972, de Peter Bodganovich, com Barbra Streisand e Ryan O’Neal –perseguições, corre-corre, a dupla de carregadores distraídos levando a enorme vidraça que escapa por um triz de quebrar-se, mas, destino inexorável das vidraças em comédias, acaba em estilhaços. Mais recentemente ainda: Sábado de Ugo Giorgetti, de 1995, a publicitária (Maria Padilha) esquecida no elevador do prédio arruinado em companhia do cadáver (Gianni Ratto) e dois coveiros (Otávio Augusto e Tom Zé). Baudelaire tinha razão ao afirmar que o riso é a manifestação do prazer diante da desgraça alheia.

Um filme em que passei mal de tanto rir: Escola de Sereias (Bathing Beauty) de 1944, com Esther Williams e Red Skelton, dirigido por George Sidney. Skelton de sapatilhas e saiote, grotesco, forçado a cursar balé porque se havia matriculado em um colégio de moças ao ir atrás de Esther Williams, a nadadora-dançarina, sua noiva. Um papel de bala gruda nele, livra-se ao fazê-lo pegar em uma colega, vai passando e grudando de bailarina em bailarina… O enredo infantilóide com todos os chavões a que o cinema de entretenimento daquela época tinha direito. A aterradora professora de balé, o vilão bobo (Basil Rathbone), a dança aquática final com Esther Williams – todos os filmes dela eram assim, bobagens como pretexto para exibi-la em coreografias de balé aquático – a piscina transformada em espaço multidimensional por Busby Berkeley, o coreógrafo que desconhecia limites. Red Skelton era rotineiro, sequer foi um criador cômico notável. Mas o timing de Escola de Sereias é perfeito. Ritmo, a condição para uma comédia ser engraçada.

Querem mais? Sortilégio do Amor (Bell, Book and Candle ) de 1958, dirigido por Richard Quine, com James Stewart, Kim Novak e Jack Lemmon, merecidamente resgatado (nas locadoras e TV a cabo). Hermione Gingold faz Stewart tomar a beberagem horrenda, um chá de morcego, sapo e ingredientes afins, para quebrar o feitiço que o fizera apaixonar-se por Kim Novak – “Drink it..! Drrink itt..!”, a megera de olho arregalado e sotaque carregado para um Stewart a exibir todas as expressões do nojo. Este “Drink it…! Drrink itt..!” virou refrão nosso em sessões de bebedeira com misturas pesadas e coquetéis estranhos. Se Escola de Sereias é a bobagem engraçada, Sortilégio do Amor está em outro nível na escala do valor – charmoso, rico em metáforas, paródia (involuntária ou proposital?) de Vertigo – Um corpo que cai, ambos do mesmo ano e com Kim Novak em seus momentos de maior beleza; em ambos, Stewart é enfeitiçado por ela. Ainda escreverei sobre a complementaridade desses dois filmes, Sortilégio do Amor e Vertigo, comédia e drama, opostos especulares.

Lautréamont em Goiânia. Poetas também.

Participo do VIII Colóquio de Filosofia e Literatura: Lautréamont, em Goiânia, nos dias 15, 16 e 17 deste mês. Minha palestra:”Lautréamont, leitor de Baudelaire”. Dia 17, sexta-feira, à tarde, encerrando.O Colóquio é organizado pela Faculdade de Filosofia da Universidade Federal de Goiás (UFG) e será no auditório da Área III da Pontifícia Universidade Católica de Goiás (PUC-GO).

Pela quantidade de estudos e publicações sobre Lautréamont, não garanto a originalidade de tudo o que direi. Algo já foi ouvido por participantes de cursos e oficinas comigo. Partirei da constatação, por Pichon-Rivière, de que o pai de Isidore Ducasse / Lautréamont já tinha exemplar de As flores do mal em sua biblioteca em Montevidéu. Lautréamont chegou á França baudelairiano, me parece. Relação vai muito além da recriação hiperbólica do poema “O homem e o mar” e ocorrências semelhantes, inclusive radicalização do “Hino à beleza” nos “belo como”. Dá para supor que pesquisou em arquivos e bibliotecas para ler artigos de Baudelaire publicados em jornais e magazines, mas ainda não em livro – por exemplo, aquele sobre o humor e o riso. Há outras relações, mais estranhas.

A seguir, a programação do Colóquio. Substanciosa. Irei para expor e para aprender. Inclui lançamentos de livros. Entre outros, encabeçados por Bachelard, a poesia de Congresso Espiritual dos Ranúnculos, por Fabrício Clemente.

Amostras da poesia de Fabricio, disponíveis no meio digital, corroboram o que venho dizendo sobre renovação através de poetas expressando-se por imagens. Vejam:

Cantar a pele de Lontra: http://cantarapeledelontra.blogspot.com.br/2009/12/quatro-poemas-de-fabricio-clemente.html
e http://cantarapeledelontra.blogspot.com.br/2010/03/novos-poetas-ii-fabricio-clemente.html

Zunai: http://www.revistazunai.com/poemas/fabricio_clemente.htm
Mallarmargens: http://www.mallarmargens.com/2012/05/locus.html

Fabricio também é autor da dissertação Estilhaços de visões: poesia e poética em Roberto Piva e Claudio Willer, apresentada à Letras da USP em 2012, por enquanto disponível em http://www.teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8151/tde-11122012-101230/pt-br.php . Espero que ganhe a forma impressa.

Confiram a programação completa:

Quarta-feira, 15/05

9h30 – abertura
10h – Marisa Werneck – O bestiário do sertão: o princípio animal em Guimarães Rosa
14h – Rodrigo V. Marques – Lautréamont à luz da psicanálise: em torno do animal humano
15h45 – Goiamérico Felício – Filosofia, poesia: mínimas coisas

Quinta-feira, 16/05

10h – Marly Bulcão – Bachelard diante do onirismo dinâmico e visceral de Lautréamont
14h – José Ternes – Bachelard e Lautréamont: literatura, primitividade e animalidade
15h45 – Éclair Antônio A. Filho – A experiência de Lautréamont, por Maurice Blanchot
19h – Evento de lançamento (Praça Universitária)

Sexta-feira, 17/05

10h – Contador Borges – Lautréamont e a violência dos signos
14h – Nilson Oliveira – Lautréamont/ Blanchot: a escrita como fratura
15h45 – Cláudio Willer – Lautréamont, leitor de Baudelaire

Lançamentos:

Lautréamont, de Gaston Bachelard Edições Ricochete, 2013

Revista Polichinello nº 14 – ‘Literatura Selvagem’

Congresso espiritual dos ranúnculos (Poesia) de Fabrício Clemente Edições Ricochete, 2013

16 de maio Palácio da Cultura, Praça Universitária  19 horas

Hitchcock e Vertigo; poesia e cinema

Tenho colaborado com a revista de cinema Reserva Cultural, dirigida por Miguel de Almeida (à venda no espaço homônimo e em revistarias da elite cultural), desde 2008. Com números antigos esgotados, resolvi postar aqui alguns dos meus artigos, ampliando acesso – são curtos, na medida para blogs. Começo por aquele de que mais gosto. Próxima publicação aqui, um poema do meu livro a sair este ano, também sobre o cineasta.  Há dois filmes em cartaz sobre Hitchcock – um, vi trechos na TV – outro, não fui ver. Dá para perceber, pela leitura a seguir, porque não gostei de nenhum dos dois, mesmo sem vê-los.

ALFRED HITCHCOCK, POETA

Claudio Willer

Em 1997, coordenei uma oficina de criação literária na qual, entre outros assuntos, fomos discutindo, capítulo a capítulo, O Arco e a Lira de Octavio Paz – leitura indispensável para quem quiser entender algo de poesia. A oficina coincidiu com o relançamento de Vertigo (Um corpo que cai) de Hitchcock em cópia restaurada. Pedi que fossem ver ou rever Vertigo, para discutirmos como se projetaria o que havíamos visto em Octavio Paz. Tratei o filme como alta poesia.

Meus oficineiros não tiveram dificuldade em fazer a conexão entre cenas e imagens de Vertigo e trechos de O Arco de a Lira, como este: “o poema tende a repetir e recriar um instante, um fato ou conjunto de fatos que, de alguma maneira, se tornaram arquetípicos. O tempo do poema é distinto do tempo cronométrico. […] Para o poeta, o que passou voltará a ser, voltará a se encarnar”. Por isso, diz Paz, “O poema é tempo arquetípico.” Scottie (James Stewart), o detetive que sofre de acrofobia e se apaixona por Carlotta, a morta revivida por Madeleine (Kim Novak) e que, depois da queda fatal do alto da torre de uma igreja, vai buscá-la, é Orfeu, patrono dos poetas.

De modo evidente, em Vertigo confrontam-se dois tempos. Um deles, o tempo da prosa e do prosaico, linear, irreversível; outro, o tempo da poesia, circular. Uma das cenas que mostram a separação de dois mundos e dois tempos, logo no início, é quando Scottie segue Madeleine em um beco cinzento. Ela cruza uma porta, entrada dos fundos de uma deslumbrante loja de flores. É outro mundo, luminoso, colorido, belo – nele, Madeleine passa a ser Carlotta, a antepassada, a morta. Nesta e nas demais cenas em que Madeleine encarna Carlotta, a iluminação muda. O mundo se transfigura.

Outra cena decisiva é aquela do parque das sequóias. Scottie e Madeleine conversam sobre o tempo: é uma sucessão de círculos concêntricos gravados no tronco da árvore secular caída, e não uma série linear. Saem do parque para dirigir-se à antiga igreja, a Missão San Juan Bautista. Partem ao encontro da queda, do instante fatal.

Nos desenhos de abertura, por Saul Bass, também há círculos concêntricos: no meio deles, com expressão de horror, a cara de James Stewart. A música de Bernard Herrmann, reparem, também é circular: no final, quando Scottie beija Judy, que é Carlotta reencontrada, o tema se repete, de um modo agônico que lembra o final de Tristão e Isolda de Wagner.

Comparei com a narrativa de Boileau e Narcejac, Sueurs froides – D’entre les morts, da qual Vertigo é adaptação. Entre outras diferenças relevantes, a queda de Madeleine é do alto da igreja, e não, como em Boileau e Narcejac, de um castelo. Hitchcok adicionou uma teofania: o sagrado como vertigem.

Se aquela oficina fosse hoje, acrescentaria algo de Baudelaire. De O Abismo, “Ai tudo é abismo! – sonho, ação, desejo intenso,/ Palavra!” Poetizaria a acrofobia de Scottie, que via o mundo como abismo. E ainda citaria este trecho do mesmo poema de Baudelaire: “Do infinito, à janela, eu gozo os cruéis prazeres” – e o projetaria em outro dos meus Hitchcock prediletos, Janela Indiscreta (Rear Window). Daria um peso metafísico ao voyeurismo do protagonista.

Hitchcok tinha consciência de toda essa riqueza simbólica? Sabe-se que as tintas psicanalíticas e o sonho por Salvador Dali em Spellbound (Quando fala o coração) foram por conta de David O. Selznick, o produtor. E o resultado, medíocre, não fez justiça nem a Dali, nem a Hitchcock. Mais tarde, em Marnie, a revelação do trauma da protagonista é, penso, psicanálise de almanaque.

Inspiração? O que houve com Hitchcock em seu período de esplendor criativo, de Janela Indiscreta até Os Pássaros? Mistérios do maior dos cineastas de narrativas de mistério.